quarta-feira, 18 de janeiro de 2012



Presidiários sobrevivem no inferno em São Paulo



Homens e mulheres que cumprem pena no maior sistema prisional do país custam, em média, R$1,3 mil por mês.
O país que não penaliza seus presos com a morte permite que eles sobrevivam à margem da falta de dignidade. O Mutirão Carcerário, promovido pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), revelou a impossibilidade de detentos terem acesso a direitos humanos básicos. Em São Paulo, são em ambientes sujos, superlotados, sem alimentação e assistência médica adequadas que o governo pretende que 179,6 mil homens e mulheres possam se regenerar.



A superlotação é considerada o ponto mais sensível do sistema prisional paulista, segundo o relatório que reúne o trabalho feito pelo CNJ no estado entre julho e dezembro de 2011. Faltam 78 mil vagas para abrigar todos os detentos. Nas quatro unidades que formam o CDP (Centro de Detenção Provisória) de Pinheiros, na Zona Oeste da capital, por exemplo, a lotação alcança 228% da capacidade.

A situação se repete em presídios e cadeias da Grande São Paulo e interior. No CDP de Osasco, 2.047 homens ocupam espaço de apenas 768. O juiz Paulo Irion, um dos responsáveis pelas vistorias nos presídios, classificou como “assustadora” a forma como os presos vivem amontoados nas celas.

O documento do CNJ, que será divulgado na íntegra em março, alerta que a superlotação impossibilita programas que permitam a reinserção do preso, como trabalho e cursos profissionalizantes. Dados do Ministério da Justiça mostram que apenas 45 mil presos passam por algum tipo de atividade laboral – isso significa que 91% dos detentos ficam 24 horas por dia sem nada para fazer.

O juiz Márcio Fraga, auxiliar da presidência do CNJ, chama atenção para a mão-de-obra desperdiçada com a falta de incentivo nos detentos (67% deles têm de 18 a 34 anos). “Ao contrário do que a maior parte da sociedade pensa, o preso gostaria de trabalhar. A ideia de que eles querem comer e dormir às custas do governo é completamente equivocada”, afirma.

A ociosidade  é de longe um dos menores problemas dos presos. Para o CNJ, muitas das unidades prisionais de São Paulo podem ser comparadas a masmorras. “Fezes de ratos, celas escuras semelhantes a cavernas, fedor generalizado, homens e mulheres amontoados em prédios decadentes, entre outras cenas medievais”, relatam os juízes.

Registros fotográficos comprovam a condição insalubre dos presídios e cadeias. Na Cadeia Pública de Cotia, todos os vasos sanitários estão quebrados. A SSP (Secretaria da Segurança Pública) diz que trabalha para melhorar a unidade. Enquanto isso, presos convivem com o mau cheiro, além de ratos e baratas que andam nos alimentos que eles comem.

A Penitenciária Feminina de Itapevi, também na Grande São Paulo, tem o mesmo problema. Lá, as presas usam baldes d’água como descarga. Apesar de a lei obrigar o estado a fornecer material de higiene para os reeducandos, as detentas não recebem objetos básicos como papel higiênico e absorventes. Algumas usam miolo de pão quando estão menstruadas.

A falta de manutenção também é recorrente. O prédio do Centro de Progressão Penitenciária 1 de Bauru, a 326 quilômetros da capital, é um exemplo. Sem reformas há 20 anos, parte da edificação pode desabar a qualquer momento.

Outro problema são os presos sob responsabilidade da SSP – atualmente, são 6 mil. Fraga  acredita que a situação dessas pessoas  em delegacias é perniciosa e que o governo tem de se empenhar mais para solucionar o problema. A falta de estrutura da polícia para lidar com os detentos se reflete em situações como a das presas que cumprem pena na Cadeia de Pariquera-Açu, a 219 quilômetros da capital, onde não há camas. A previsão da SSP é de que até 2014 todos os detentos sejam transferidos.

Em nota, a SAP (Secretaria da Administração Penitenciária) ressaltou que ainda não teve acesso ao relatório do CNJ, mas garantiu que todas as unidades funcionam dentro das normas de segurança e que a intenção da pasta é “proporcionar melhores condições de cumprimento de pena, com mais dignidade e segurança para presos e servidores”. A SAP afirma fornecer materiais de higiene para todos os detentos e diz que o governo pretende criar 39 mil vagas até o final da gestão.

“Tratar o preso com respeito não é só uma questão de direitos humanos. É pensar em saúde e segurança pública”, diz Fraga. Para o magistrado, problemas graves dentro da cadeia inevitavelmente ultrapassam os muros da prisão. Exemplos são os surtos de doenças e a facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital), nascida dentro do sistema prisional paulista e hoje um dos grupos 
criminosos mais atuantes e influentes do país. 


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