O Bolsa Família e a Lei Dos Pobres de 1601
A perda de bens da Igreja, impedindo-a de praticar a caridade e a ampliação da migração rural urbana estimulada pela crescente demanda de lã (enclusure) , aumentou a quantidade de pobres nas cidades inglesas .
Em 1601, surgiu a Lei dos Pobres que concedia auxilio financeiro, mas obrigava os homens capazes a prestar serviço em asilos e albergues . As crianças tinham que frequentar a escola. Quem não trabalhava era açoitado, preso e poderia ser até condenado à morte . A lei consolidou a idéia de que o governo é responsável pelos pobres e foi o embrião do moderno Estado do Bem Estar Social .
Serviu de inspiração para o seguro nacional contra a doença e velhice criado na Alemanha por Bismarck no início da década de 1880, a política oficial de habitação na Inglaterra, no início da década de 1890 , e a lei de seguridade social dos EUA em 1935."
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O Programa Bolsa Família (PBF) é um programa de transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País. Vivemos num país com aproximadamente 190.755.799 habitantes [IBGE 2010], estamos em 84º no IDH, porém animem-se [...], somos a 6º maior economia do mundo .
“Ah, mas o bolsa família tá ai pra ajudar a melhorar esse IDH, já que ajuda os mais necessitados”. Não, não é bem assim, aliás, não é nada assim. Fazendo um pequeno paralelo com a Inglaterra do século XVII, apresento-lhes a Lei dos Pobres de 1601. Agora, o que uma lei inglesa do século XVII tem a ver com o Brasil do século XXI? Muita coisa.
A Lei dos Pobres foi criada em 1601, no final do reinado da Rainha Elizabeth. Assim como temos hoje, na época houve a necessidade da criação dessa lei, a partir de alguns fatores básicos que contribuíram para isso, dos quais, são: o aumento excessivo da população, o fato da igreja pregar que era dever do estado suprir as necessidades dos menos favorecidos e, por ultimo um controle hegemônico perante a população. Agora perceba a coincidência, a Lei dos Pobres consistia basicamente em: Um fundo monetário a todos que não tinham trabalho ou condição de sustentar seus filhos, mas tinham força o suficientes para trabalhar, assim, essas pessoas deveriam trabalhar para o estado e para a igreja.
Duas coisas contribuíram para a consolidação da lei, uma delas é o fato que como a população aumentou demais, houve desestabilidade econômica. Mas não só isso, havia também na época a ideia da retirada dos mendigos e ociosos da rua, assim, a lei veio para dar uma ocupação a estes. O estado, então, tornou-se o angariador desse fundo e foi isso que o tornou responsável pelo bem estar social, do estado moderno que conhecemos hoje. Na Lei dos Pobres, todos sem renda poderiam usufruir dela. E como a igreja era a responsável pela distribuição do fundo arrecadado pelo estado, a igreja muitas vezes se sobressaia as custas dos trabalhos realizados perante a lei. Já que, quem recebesse o auxilio e não cumprisse sua parte, poderia ser sentenciado a morte.
Ou seja, a Lei dos Pobres, foi uma lei que beneficiava quem não tinha chance de se sustentar, já que mantinha os órfãos em camas limpas, tirava mendigos das ruas e por fim, colocava todo mundo pra trabalhar [uma maravilha]. Assim, percebe-se que uma lei que apareceu há 400 anos não desapareceu até hoje. Ela apenas está [muito] mais branda perante o caráter da punição. Agora, ninguém mais é preso se tirar o filho da escola [para receber o bolsa família, os filhos devem estar matriculados em uma escola], portanto, a lei só aderiu a elementos da nova cultura, já que os desejos do século XVII são diferentes dos desejos do século XXI.
Ainda partilhamos da lei dos pobres, mas nem por isso devemos entender que apenas o estado se beneficia com tal estrutura social. Se pegarmos de exemplo o costume das esmolas da Inglaterra oitocentista entenderemos um pouco dessa relação. No período o ato da esmola é representado como uma forma de obrigação perante a Deus e, também como uma forma de manter a pobreza [mesmo que inconscientemente]. Não só o “rico” tem suas intenções ao dar a esmola, mas também havia intenções de quem a recebia. Já que este [quem recebe] pode usar tanto sua condição, quanto as crenças do rico, para extrair tudo que for possível dele, pois a recusa da esmola naquela época causava o sentimento de culpa.
As estruturas mudam conforme a época. Existe uma mão dupla numa análise como essa, pois ambos os lados são agentes sociais e cada qual tem seu interesse perante a um costume; o ato de doar deve ser visto também como um ato de ganhar, por isso o ser social determina a consciência social. Às vezes a pratica é, mesmo sem consciência, uma forma de tentativa de impedir uma espécie de rebelião da classe mais baixa, já que a classe mais alta consegue, por meio desse costume, um controle hegemônico. Então, assim como no caso das esmolas, havia também uma espécie de aproveitamento por parte dos pobres, não se pode apenas julgar o estado como detentor do controle hegemônico e a população é passiva, a população mesmo que sem querer faz sua represália.
Por exemplo, no caso da lei dos pobres, idosos e crianças conseguiam fugir do trabalho, porque muitas vezes não eram considerados aptos. Já no caso das esmolas, na época, era vergonhoso e um pecado não dar esmolas. Se você era feliz, deveria ajudar um infeliz. Quando eu afirmei que o recebedor aproveitava da situação para extorquir, era, de fato, o que ocorria e a prova disso é que hoje MUITA gente não está nem ai pra alguém que pede esmola.
Na década de 70, no Brasil, começaram a surgir os chamados meninos de rua [o país não dava condições aos orfanatos etc, não tinha lugar pra todo mundo. É obvio que sempre existiu meninos de rua, porém, a situação se agravou]. Esses meninos precisam ganhar a vida, assim se postam nos semáforos, oferecendo trabalho em troca de umas moedas. Ainda funcionava perante a questão do aproveitamento, eles trabalhavam e tinha certa “recompensa”. Isso se saturou de tal forma, que hoje, todo mundo sobe o vidro na cara dos guris. É o mesmo caso das esmolas.
Retornado ao bolsa família; pelo menos a ideia é mais velha do que a gente imagina. E é sim uma forma de controle hegemônico e é sim² uma forma de deixar o pobre sempre pobre [é claro que existem exceções, não estou aqui pra generalizar]. Por mais baixo que seja o IDH de um país, ele é medido pela renda per capita, portanto. se alguém resolver diminuir ou aumentar 1 dólar nesse parâmetro, IDH’s sobem ou descem.
As diferenças entre a Lei dos Pobres de 1601 e o bolsa família, são a época, as formas de punição e a condição pra participar [visto que antes era necessário trabalhar para o estado/igreja]. Hoje, se o bolsista tirar o filho da escola [condição], só ocorre a perda do beneficio, ao contrário da prisão e morte.
Com o texto, tentei deixar claro que a pobreza não será erradicada com programas assim. Nunca foi e não será agora. “Nada” se difere da tentativa de controle hegemônico social de 400 anos atrás. É claro que eu concordo que, pelo menos, ajuda o pessoal e também coloca as crianças na escola. Acho bárbaro, entretanto, pois isso apenas cria números e não tantos resultados quando poderia se criar. Repetindo: Não é teoria da conspiração, tanto é que segundo os exemplos, o próprio beneficiário pode muito bem se aproveitar da situação. Fato que também, segundo os exemplos, pode fadar o programa à ruína. É claro não da pra cometer anacronismos, por isso afirmo que as estruturas mudam, os processos mudam, mas tudo, num contorno do evento, faz com que o evento continue igual, apenas se adequando à nova estrutura social.
Espero que tenham gostado. O post tem o intuito de criar uma discussão acerca da funcionalidade e do benefício desse “benefício”. Deixem seus comentários e claro, não esqueçam de curtir.
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