segunda-feira, 2 de maio de 2011
Desde a instalação de três unidades prisionais, a partir de 2003, o município coleciona problemas
Desde a instalação de três unidades prisionais, a partir de 2003, o município coleciona problemas
Carlos Calaes - Repórter - 2/05/2011 - 08:49
LUCAS PRATES
Com cerca de 25 mil habitantes, São Joaquim de Bicas abriga 3.600 detentos em unidades prisionais
BLOG DOS AGENTES PENITENCIARIO DE MG
Desde a sua emancipação, por desmembramento do município de Igarapé, em 21 de dezembro de 1995, São Joaquim de Bicas, a 45 quilômetros de Belo Horizonte, viveu durante quase oito anos a tranquilidade e o bucolismo de uma cidade típica do interior mineiro, apesar da proximidade com a capital. Mas, a partir de 2003, a vida do jovem município começou a se transformar. E não, necessariamente, para melhor. Naquela época começou a implantação de um complexo prisional que hoje conta com três unidades e abriga 3.600 detentos, o equivalente a aproximadamente 14% da população, que é de 25 mil habitantes.
Apesar das promessas do Estado de levar benfeitorias a São Joaquim de Bicas como contrapartida aos presídios, a realidade hoje é de terrenos invadidos no entorno das unidades, sobrecarga no sistema de saúde pública por conta do atendimento aos presos, estradas em situação precária e falta de travessia pelo Rio Paraopeba ligando o complexo ao Bairro Citrolândia, em Betim.
Em seu terceiro mandato, o prefeito de São Joaquim de Bicas, Antônio Carlos Resende, o Toninho Resende (PMDB), vem cobrando compensações para o município dos últimos três titulares da Secretaria de Estado da Defesa Social (Seds), sem obter sucesso.
O ofício mais recente foi encaminhado em 16 de março para o secretário Lafayette Andrada. Nele, o prefeito enumera as mazelas do município provocadas pelo impacto do complexo penitenciário e aponta possíveis soluções.
No documento, o prefeito lista o péssimo estado da estrada de acesso ao complexo e denuncia a sobrecarga que o atendimento médico aos presos provoca ao sistema municipal de saúde em prejuízo à população.
A balsa clandestina é a única opção para quem quer atravessar do lado dos presídios para o Bairro Citrolândia, em Betim (Foto: Lucas Prates)
Também cobra providência com relação à ocupação irregular dos terrenos do Estado no entorno do complexo. Segundo ele, no local foi implantado um loteamento clandestino chamado Residencial Dallas, sem alvará da prefeitura, além de outra área que foi invadida por famílias que seriam do movimento sem-terra.
Para o prefeito, o ideal seria a construção de um distrito industrial no entorno do complexo que, além de alavancar a economia local, possibilitaria a utilização de mão de obra dos presos, conforme sugere.
Procurada pelo Hoje em Dia, a Seds não apontou soluções para os problemas apontados pela prefeitura de São Joaquim de Bicas.
Ocupação e acesso precários
Quase em frente à entrada da Penitenciária Professor Jason Albergaria – uma das três unidades prisionais de São Joaquim de Bicas –, centenas de moradores ocuparam terrenos de forma irregular e instalaram pequenos bares e restaurantes, na intenção de lucrar servindo a familiares de presos. Um comerciante, que pediu anonimato, contou que levanta todos os dias de madrugada para preparar as refeições que são vendidas. “Mal de Bicas se não fossem esses presídios”, diz, referindo-se à oportunidade de geração de renda.
Um pouco à frente, Ana Maria da Silva Matos, 58 anos, abriu uma espécie de trailer onde vende salgados, biscoitos e refrigerantes. Além do trabalho, ela cuida da irmã, Júlia, 50 anos, que ajuda em pequenas tarefas.
Além da oportunidade de ganhar um dinheiro com comércio, os presídios “incentivaram” a ocupação irregular dos terrenos no seu entorno, principalmente, por familiares de detentos, que buscam ficar perto de seus parentes.
Um caso exemplar é da dona de casa Maria Pereira Santos, 57 anos. Ela já mora nas imediações da Penitenciária Jason Albergaria e tenta junto ao Estado a transferência para lá do filho Roney, que cumpre pena no presídio Inspetor José Martinho Drumond, em Ribeirão das Neves.
Balsa cobra R$ 1 para atravessar Rio Paraopeba
Como a ocupação dos terrenos próximos das unidades prisionais não foi planejada, o acesso é precário. A travessia de pessoas entre o complexo penitenciário e o Bairro Citrolândia, em Betim, pelo Rio Paraopeba, é feito por uma balsa, que não tem autorização da prefeitura para funcionar.
Denominado “Balsa Paraopeba”, o serviço é feito por uma embarcação criada com dois barcos unidos e conduzidos por dois homens que puxam as cordas com os braços para fazer o movimento de uma margem à outra.
A embarcação circula das 5 horas às 19h30, todos os dias. A passagem custa R$ 1. A travessia do rio no local tem 25 metros de distância e demora cerca de dois minutos. Apenas menores de 12 anos e maiores de 60 têm de usar coletes salva-vidas.
Como não tem autorização da prefeitura para funcionar, o serviço não é fiscalizado e coloca em risco a vida dos passageiros. Ao ser contatado por telefone, Cristiano da Mata, neto do responsável pelo serviço – o empresário Joel Tomé –, ficou irritado. “Aqui tem um monte de ônibus pirata, mas todo mundo só vê a gente”, reclama. Cristiano alegou que o serviço tem alvará da prefeitura e foi fiscalizado pela Marinha.
De acordo com o agente da Capitania dos Portos do Espírito Santo – que responde por Minas Gerais – Sargon Evangelista, a Marinha realiza apenas a vistoria das embarcações e procedimentos, mas a concessão do serviço é de competência da administração municipal. Por sua vez, a prefeitura informou que o serviço é clandestino e não tem alvará.
São Joaquim de Bicas, uma cidade refém dos presídios
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