Elas são acusadas de traficar, roubar e matar. Mas a criminalidade é a primeira característica que têm em comum. Todas essas mulheres estavam grávidas no momento em que foram presas. Hoje, elas vivem no único presídio exclusivo para gestantes e mães com bebês, em Vespasiano, Minas Gerais. Marie Claire visitou a cadeia para mostrar as histórias dramáticas e a rotina delas
Duas mães conversam enquanto seus filhos, de oito e dez meses, brincam em uma banheirinha de bebês. Eles batem os bracinhos na água e tentam segurá-las nas mãos. Dão gritos e risadas. Na sombra de um paredão a poucos metros dali, outra mãe amamenta o filho recém-nascido, vestido com um macacão branco e uma touquinha na cabeça. Em um banco, em outra sombra, uma grávida suspende a camiseta para arejar a barriga de quase nove meses. A cena poderia ter acontecido em uma praça, parque ou clube. Mas se deu em meio a muros de três metros de altura, cobertos por cercas elétricas de alta voltagem e circundados por policiais com armas de fogo de 12 milímetros. As mulheres descritas acima estavam presas na única cadeia do Brasil projetada somente para grávidas e mães com bebês de até um ano de idade, em Vespasiano, nos arredores de Belo Horizonte, Minas Gerais. Inaugurado em fevereiro, o Centro de Referência à Gestante Privada de Liberdade abriga 40 mulheres que - em sua maioria - foram presas ao comprar, vender, armazenar ou transportar papéis de cocaína ou pedras de crack. Há também quem tenha roubado um celular, assaltado um banco ou matado por amor. Todas estavam grávidas no momento da prisão.A criação do presídio vai ao encontro do aumento da participação das mulheres em ações criminosas. Segundo informações do Departamento Penitenciário Nacional, a taxa de encarceramento feminina cresce mais rapidamente do que a masculina. Enquanto o número de homens presos dobrou entre 2000 e 2008, a quantidade de presas quadruplicou no mesmo período. 'Assim como a presença da mulher aumenta no mercado de trabalho, também cresce no crime, principalmente no tráfico de drogas. A diferença é que elas não alcançam o status deles na organização criminosa. São meras vendedoras, aviões. Por terem menos poder, são presas com mais facilidade', diz a socióloga Alessandra Teixeira, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM). O impacto da prisão da mulher é mais violento para a família do que a do homem. Quando eles são presos, elas costumam manter os vínculos afetivos. Em geral, visitam os parceiros na cadeia, sustentam os filhos e cuidam deles. Mas as detentas raramente recebem visitas dos maridos ou namorados. 'Os filhos ficam abandonados e depois, quando elas ganham liberdade, a família tem dificuldade em se refazer', diz Maurício Campos Júnior, secretário de Defesa Social de Minas Gerais. 'O fato de manter as mães com os filhos na cadeia visa a reforçar esses vínculos', diz. A ideia é que a dedicação integral à criança ajude a florescer o sentimento de maternidade e responsabilidade nas detentas, que deixariam de viver na criminalidade para se dedicar mais à família. As 40 internas de Vespasiano se alojam em oito grandes quartos. Os berços ficam ao lado das camas das mães. Cinco ou seis detentas e seus respectivos bebês dividem o mesmo espaço. As portas dos quartos nunca são trancadas, mesmo à noite. Há grades somente nas janelas, na porta que divide o alojamento do restante do presídio e na cozinha. No muro do pátio, a célebre citação de Cecília Meireles: 'Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta. Não há ninguém que explique e ninguém que não entenda'. Nas mesas de trabalho das funcionárias, bonecas e bichos de pelúcia. Segundo a diretora da penitenciária, Mariana Theodosakis, os brinquedos estão ali para descontrair o ambiente, previsivelmente carregado pelas sisudas feições das agentes penitenciárias. Não existem salas reservadas para visita íntima, praxe em cadeias masculinas. 'Se elas engravidam, é o governo que tem de arcar com os custos dos filhos. É injusto, eu sei, mas é a realidade', diz o secretário mineiro.
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A relação tensa entre agentes penitenciários e presos está produzindo uma pressão no Congresso Nacional para que esses profissionais consigam o direito ao porte de arma. O assassinato de pelo menos sete agentes penitenciários, de agosto a dezembro do ano passado, no país, serve de combustível para a discussão. Segundo o Sindicato dos Servidores do Sistema Penal do Rio, dois mil agentes foram assassinados no país na última década.